quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

microcorpos de você

meu corpo é formado
deformado
de microcorpos de você
cada um com seios, pés e olhos
carregando o fardo do teu nome
são células cancerígenas
quais não consigo remediar
de nenhuma forma

por este motivo eu bebo
eu fumo e me mato 
a cada instante

na urina avermelhada
um mosaico do teu rosto
no escarro avermelhado
um mosaico de tuas pernas


domingo, 26 de janeiro de 2014

meu mundo-umbigo

minha mãe limpava meu umbigo
até os meus 12 anos
minha mãe parou de limpá-lo 
por volta deste mesmo ano
o mundo de certa forma mudou
quando enfim completava meus 13 anos
foi aí então que percebi 
que o mundo não era meu umbigo 

aspirações

estive num sonho estranho
andava por ruas em p&b 
sedento de sangue, uísque e nicotina
sedento de sexo 
sexo bem feito por dentro dos boeiros

no sonho eu portava 
uma pistola calibre 38
um caráter de sociopata
um sorriso irônico
uma moral majestosa

eu tenho sonhado demais
devo pedir perdões a insônia 

ela me chamou de babaca

eu só dei uma pequena mordida em seus peitos
achei que estava agindo corretamente
foi uma mordida de tesão e carinho
enquanto arranhava suas costas num prazer imenso
mas, depois disso ela ainda me sugou 
ela é um pouco interessante
é um pouco diferente do resto das pessoas que conheço

mesmo carregando o fardo de montar um personagem
vestir-se feito um personagem 
e não me mostrar como é realmente
mas, eu mordi seus peitos 

com ela sou um cão que observa a televisão de cachorros
os frangos que assam; girando sucessivamente
com ela sou um cão faminto 

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

a mulher verdadeira

a mulher verdadeira
hei de encontrar

cheia de tristezas, mágoas e ressentimentos
ódio, clamor, ira, tempestades inteiras
a mulher de cabelos longos e de eternos momentos
a mulher verdadeira

cheia de sorrisos falsos, músicas clássicas
amor, - sem poses, não quero estátuas -
quero a mulher verdadeira - sem truques ou mágicas -
que é toda coberta de mágoas
a mulher verdadeira

hei de quebrar sua aura escura
com a frequência de meu anuvio
hei de assassinar homens
e queimar seus navios
pela mulher verdadeira

o mundo pela mulher verdadeira
sem metades
quero-lhe inteira
sem tríades 
a mulher verdadeira

tempo solidão

tempo solidão

dos aconchegos temporários 
o amor eterno 
e só

ode às plumas

A tristeza é enxaguada pelos olhos
assim como o para-brisa de um carro
que ora limpa e lava a fuligem 

outrora se esquiva da chuva

O para-brisa ora lembra as janelas
que enxergam a chuva bater
contudo, nada fazem senão deixá-la

A tristeza ora lembra a chuva
que cai sem trégua na terra
ainda que nos momentos de enchente

O carro ora lembra a vida
que percorre os caminhos
sequer sem saber o rumo

O carro ora quebrou o para-brisa
A chuva ora cessou a tristeza
O caminho ora cessou o rumo
A enchente ora alcançou a janela

por um momento

a traição
não é maldade
ou é paixão
ou é vontade


segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

elegia à vida

A vida é uma merda e sempre vai ser uma merda. Por isso lhe chamam vida. É uma prerrogativa da paz que não existe. Quando por acaso me perguntam sobre a sorte respondo friamente que é um conceito de merda. Criado por pessoas de merda, fracas e desvalidas da tal felicidade. Quando me perguntam sobre Deus quase dou a mesma resposta como um cão raivoso. Mas, respiro e digo que não posso crer em algo maior do que eu. Meu ego não permite. Meu ego é o meu Deus desde meu nascimento. Insatisfeitos logo me perguntam sobre o amor. Ah... Eu suspiro fundo. Lembro-me de uma moça de cabelos bem ornamentados que me lembravam folhas de jornais voando ao vento da cidade vazia. Lembro-me de beijos longos na pracinha de bancos feitos a calcário e cuspi. Uma paz cinematográfica. Mas, não respondo nada. Inquieto-me e logo fujo do assunto. A vida está cheia demais de histórias de amor fracassadas. Imaculadas. Arruinadas pela vida.

domingo, 19 de janeiro de 2014

odã para Tereza (número um)

ando pelos mesmos botequins de antigamente. se quer me ver passa um dia naquele de esquina ali no centro. em frente ao posto. eu sempre me escondo da sobriedade. lá eu entro com a sombra que bebe junto a mim e que sempre deixa a conta para que eu pague. um intruso. uma sanguessuga. uma amiga que vive de aba. alguns chamam ela de... Tereza. a maldita bebe caixas e caixas de cerveja e se embriaga com qualquer líquido que queime a garganta. Palhinha, Coquinho... qualquer inho para ela serve. é um puta porre. a minha ressaca começa no primeiro gole. se olho para o copo e enxergo dois depois de alguns minutos sentado na mesa. ela já está me acompanhando. sinto que vai dar merda. que o dinheiro não vai dar e que no final da noite a vida vem a tona. vem para lembrar que segunda-feira dá portada na cara. dá chute no saco e soco na barriga para o despertar às 4:45 da manhã. aí é quando eu acordo já vestindo Tereza. ela é roupa de brechó. amarrotada, velha, desbotada, mas todos me dizem que sempre cai bem. eu ando precisando comprar roupa nova, mas nunca sobra dinheiro no fim do mês. Tereza bebe tudo.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

o homem há de admirar a mulher como a rosa

tão vil é o homem que admira a rosa desabrochando todos os dias para seu espetáculo próprio. o verdadeiro homem há de admirar a mulher como a rosa que só por existir já encanta o mundo. a hombridade não está nos pés ou nas mãos. está no olhar. mas, também não está no olhar que devora o caule da rosa. e sim no olhar que admira o caule com discrepância. há de se entender que só pela rosa existir o mundo já brilha com seu aroma; com sua forma; com seus atributos que variam de espécie para espécie. quando um homem arranca a flor do solo. é preciso a permissão da rosa que avisa sua prontidão com os uivos do vento. delicada. sempre tão delicada. o homem por fim há de ser também o pequeno florista de sonhos, o pequeno cultivador de esperanças e o pequeno jardineiro de felicidades caminhando assim lentamente para a eternidade.

sábado, 11 de janeiro de 2014

a carícia

travestida de amor ela vem 
vem feito vento
num dia de calor escaldante
onde se anda por entre o cimento
quase desmaiando
tonteando
balanceando

mas, ao se sentir tocado
pelo vento que vai e volta
refrescando o corpo já molhado
frisando-lhe como escolta

não desmaia
não tonteia 
nem ao menos se balanceia
apenas troca os passos
e embebeda-se

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

O Eremita

eu me entremeei por entre a fumaça dos teus olhos
onde você me enxergava estático e pálido
assustando tua retina
estava revestido por pequenas lembranças como ranços de cotidianos passados
mas, teu rosto instantaneamente recolocou a cor e a beleza que os anos tiraram
enxerguei-nos finalmente como rochas sob rochas
à fim de montar a mais bela gruta
onde lá quietos nos resguardaríamos do mundo
mas, tua chegada era tão efêmera como tua existência
então restitui o vazio que eu guardava dentro de mim
e assim ergui a tal gruta com a desumanidade do tempo
pondo-me só como o eremita